Câmara técnica discute possibilidade de ampliar quarta dose para idosos e profissionais de saúde
A aplicação de uma segunda dose de reforço, ou quarta dose da vacina contra a Covid-19, começa a ser debatida no Brasil esta semana. Membros da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização Covid-19 (Ctai), criada para avaliar medidas de combate à pandemia no âmbito do Ministério da Saúde, vão abrir a discussão sobre uma possível nova etapa de imunização, atualmente adotada por Chile e Israel.
Desde o final de dezembro, uma nota técnica do ministério recomenda a quarta dose no Brasil apenas para pessoas imunossuprimidas, quatro meses após o reforço. Outros países, como Alemanha e Estados Unidos, atualmente discutem a possibilidade dessa aplicação extra diante da explosão de casos da Ômicron.
O infectologista Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), um dos integrantes da câmara técnica, diz que o grupo vai avaliar a necessidade e o intervalo dessa dose adicional para idosos e profissionais de saúde no país.
Até o momento, não há estudos conclusivos sobre o assunto, que indiquem queda na proteção após o reforço ou em que momento isso aconteceria. Os primeiros dados começam a surgir em Israel, onde a quarta dose é aplicada em maiores de 60 anos e outros grupos de risco. Ontem, um painel consultivo do Ministério da Saúde israelense recomendou incluir nesse novo esforço todos os adultos, cinco meses após a terceira dose.
No Brasil, a dose adicional já vem sendo aplicada em Botucatu, no interior de São Paulo, nos idosos que residem em instituições de longa permanência. A cidade ampliou a cobertura vacinal e avançou etapas do programa desde que foi escolhida para um estudo do imunizante AstraZeneca, no ano passado. Hoje, 90,7% dos moradores estão totalmente imunizados e 65,9% já receberam a dose de reforço.
O chefe do departamento de Infectologia da Unesp, Alexandre Naime Barbosa, afirma que “muito provavelmente” a aplicação extra será ampliada no país.
“Os imunossuprimidos têm dificuldade de produzir anticorpos e de mantê-los por mais tempo, o que torna a resposta vacinal menos intensa e mais efêmera. Para a população em geral não existe um consenso sobre necessidade”, afirma Naime Barbosa. “O mais próximo disso são os idosos, que em algum grau também são imunossuprimidos, porque vivem a imunossenescência (envelhecimento do sistema imunológico).”
A decisão de expandir o grupo que recebe uma segunda dose de reforço é defendida pela gravidade da situação em que vivemos, com a alta provocada pela variante Ômicron.
“Não temos resultados práticos em mãos, mas a Ômicron está aí. É um momento de muita infecção. Se tivéssemos mais tempo para decidir seria ótimo, mas infelizmente não temos. Trocar o pneu do carro com ele andando é muito difícil. Então essa pauta começa agora a ser discutida no Programa Nacional de Imunizações (PNI)”, afirma o infectologista.
Segundo ele, a decisão terá mais peso em março, quando boa parte dos idosos completa seis meses do início da aplicação do reforço. Por outro lado, Naime Barbosa reconhece que é mais urgente levar a terceira dose para todos.
A discussão sobre essa nova etapa da vacinação também é alvo de críticas. A epidemiologista Carla Domingues, que coordenou o Programa Nacional de Imunizações (PNI) de 2011 a 2019, considera que, até que existam estudos conclusivos, não é hora de pensar em quarta dose:
“Estamos perdendo o foco, nem termina uma etapa da vacinação e já começa outra. Se surgirem evidências de que há uma nova variante que exige quarta dose, é o que vamos fazer. Mas nenhum estudo mostra isso ainda.”
Domingues frisa que falta clareza nas metas. Cerca de 69% dos brasileiros contam completaram o ciclo vacinal básico e apenas 18% receberam dose de reforço. Para ela, a prioridade deveria ser de garantir a imunização de toda a população acima dos 5 anos com duas doses e o reforço para todos os adultos.
“A meta é vacinar 80% ou 90%? Isso precisa ser definido para ser cobrado. No Norte e Nordeste há municípios com cobertura menor de 40%.Não podemos seguir e deixar gente para trás. É preciso atingir elevada cobertura vacinal de forma homogênea. Como ação de saúde pública, o que se quer é a vacinação em massa. Além disso, não é factível vacinar toda a população a cada quatro meses, esgotando equipes de saúde e gastando dinheiro público”, completa.