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A orgia da Lei Ruanet: Governo Lula reabre os cofres do Ministério da Cultura

 A orgia da Lei Ruanet: Governo Lula reabre os cofres do Ministério da Cultura
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Trezentos mil reais para a gravação, em tempos de streamming, de 2 mil DVDs de música; mais R$ 300 mil para a distribuição de 8 mil álbuns de figurinhas sobre a tradição de uma cidade no interior de São Paulo; R$ 960 mil para produzir um catálogo com o tema “sustentabilidade”; e R$ 5 milhões para um projeto que causou polêmica nesta semana: uma peça de teatro da atriz Claudia Raia. Essas iniciativas se juntam a outras 2 mil, todas autorizadas a captar recursos da Lei Rouanet. O anúncio foi dado nesta semana pela ministra da Cultura, Margareth Menezes, que liberou R$ 1 bilhão para custeá-las.

“Em apenas 20 dias de trabalho, o Ministério da Cultura (MinC) identificou os projetos que já tinham sido liberados pela Rouanet, mas que estavam bloqueados pela administração passada”, disse Margareth, ao comemorar o que chamou de “notícia maravilhosa”. A boa-nova aos artistas, contudo, ressuscitou um passado sombrio e nebuloso da era PT que incomoda os pagadores de impostos, sobretudo no que diz respeito a dois tópicos: 1) quantidade de dinheiro destinada a projetos aprovados, cuja qualidade é bastante duvidosa; 2) critérios de escolha que privilegiam peixes grandes ou obras com viés de esquerda.

Passado sombrio e nebuloso

Batizada de Rouanet em homenagem a Sérgio Paulo Rouanet, criador da lei e secretário de Cultura de Fernando Collor de Mello, a lei instituiu o Programa Nacional de Apoio à Cultura, em 23 de dezembro de 1991. O dispositivo tem a finalidade de incentivar projetos culturais como forma de girar a economia e valorizar a arte. Com os anos, a Rouanet passou a ser criticada por setores da sociedade, em razão da forma como foi usada pelos governantes.

Em 2013, durante o primeiro mandato de Dilma Rousseff, o documentário O Vilão da República, sobre a vida de José Dirceu, conseguiu autorização para captar R$ 1,5 milhão da Rouanet. A ideia da diretora era “acompanhar a intimidade deste personagem controverso, num momento importante de sua vida”. O filme narra a história de Dirceu, contando a sua trajetória na guerrilha, a chegada ao primeiro escalão do governo Lula até a condenação, quando o ex-ministro foi sentenciado a mais de dez anos, no julgamento do Mensalão.

Sete anos antes, o filme Brizola, Tempos de Luta conseguia quase R$ 2 milhões da Rouanet, para discorrer sobre o passado do ex-governador do Rio de Janeiro. Paralelamente, o MinC, sob Lula, negara patrocínio a um filme sobre o ex-governador de São Paulo Mário Covas, do PSDB. Entre as empresas que apoiaram financeiramente o projeto sobre Brizola, estão as estatais Petrobras (R$ 592 mil), Eletrobras (R$ 300 mil) e CEEE (R$ 50 mil).

Ainda na esteira de privilégios a obras mais à esquerda, em 2011, a cantora Bebel Gilberto, apoiadora de Lula e Dilma Rousseff, captou quase R$ 2 milhões para uma turnê pelo Brasil. O dinheiro fora liberado por sua tia, a então ministra da Cultura, Ana de Hollanda, irmã do compositor Chico Buarque. Bebel teria tido vantagens sobre outros artistas. Com o montante, ela gravou um CD e apresentou-se em 11 cidades ao redor do país. Ana negou qualquer irregularidade no processo que beneficiou a sobrinha. Desgastada, a ministra deixou a pasta posteriormente.

Outro projeto que chamou a atenção, não tanto pelo conteúdo, mas pelo preço e por quem o propôs, diz respeito a um blog da cantora Maria Bethânia, chamado “O Mundo Precisa de Poesia”. O trabalho obteve permissão para captar R$ 1,3 milhão. Na época, o caso levantou um debate sobre se Maria Bethânia, uma artista já consagrada, precisava da Lei Rouanet para conseguir um patrocínio, em vez de dar espaço para artistas menores à procura de empresas que possam ajuda-los a mostrar seu trabalho. Nas redes sociais, o valor também foi interpelado. Isso porque um blog pode ser hospedado gratuitamente em plataformas como Medium e WordPress. Após a repercussão negativa, a cantora desistiu da ideia. Em 2022, Bethânia “fez o L”, durante um show, e declarou voto no candidato Lula.

Somam-se a todos esses problemas fraudes mais graves, em virtude da falta de fiscalização e transparência adequadas no MinC. Em 2016, no âmbito da Operação Boca Livre, a Polícia Federal (PF) indiciou 14 pessoas, entre elas empresários, advogados e executivos de grandes companhias, lideradas pelo Grupo Bellini, por roubo de R$ 180 milhões na Lei Rouanet. A verba era desviada através de projetos irregulares.

A PF concluiu que diversos projetos de teatro itinerante voltados para crianças e adolescentes carentes deixaram de ser executados, assim como livros não foram doados a escolas nem bibliotecas públicas. Os criminosos usaram o dinheiro público para fazer shows com artistas famosos em festas privadas para grandes empresas, livros institucionais e até a festa de casamento de um dos investigados na Praia de Jurerê Internacional, em Florianópolis, Santa Catarina. O casamento de Carolina Monteiro e Felipe Amorim teve a presença de um cantor sertanejo.

A imoralidade fica ainda mais escancarada em razão do descaso do poder público com o patrimônio brasileiro. Incendiado em 2018, o Museu Nacional havia solicitado, antes da tragédia, por meio da Rouanet, durante a gestão Temer, patrocínio para alguns projetos de reforma. Infelizmente, foram autorizadas apenas as iniciativas ligadas a melhorias do site da instituição e exposições de espécimes. O desrespeito se estende também às igrejas em Salvador, na Bahia, que há décadas aguardam ajuda do setor cultural para reformas. Uma das poucas que conseguiram liberação de verba foi a Igreja da Ordem Terceira de São Francisco, no Pelourinho (Salvador), que recorreu à mídia para ganhar visibilidade e ser restaurada. Um dos apelos da classe artística a Margareth Menezes é que também incentive patrocínios à Biblioteca Nacional, para restaurá-la e evitar o mesmo destino da Cinemateca, que pegou fogo em 2021.

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